O Fenómeno Félix
- Admin
- 23 de jun.
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Atualizado: 29 de jun.
Uma análise ao valor de mercado e à perceção em torno do Menino de Ouro do Benfica.

João Félix é aquele jogador que, mesmo sem deslumbrar, nunca sai de moda. Todos os anos, por mais discreta que tenha sido a época, volta a estar ligado aos grandes clubes da Europa. Um dia no Barcelona, outro no Chelsea, outro no Milan. É como se o futebol continuasse à espera do momento em que, finalmente, ele vai corresponder à promessa. A resposta é menos romântica do que parece. Não é magia. É marca, e Félix, goste-se ou não, ainda é um produto com valor.
Apesar das críticas, há um facto inegável: João Félix tem qualidade. Receção orientada, passe curto, agilidade no drible, finalização. É o tipo de jogador que consegue ser diferenciador a qualquer momento, mesmo sem estar envolvido no jogo. No futebol de topo isso continua a ser um trunfo valorizado. Treinadores, observadores e diretores desportivos olham para estas qualidades e pensam: “Se ele fizer isto com regularidade, temos um jogador de topo mundial.” O mercado vive muito da premissa de que há sempre mais para retirar do atleta. João Félix tem 25 anos. Parece mais velho, talvez porque já esteja nestas andanças desde os 18. Mas está agora a entrar naquilo que se espera ser o pico de rendimento de um jogador ofensivo, ou seja, os clubes ainda podem justificar um investimento com base no que pode vir a ser, não apenas no que já foi. Isto é especialmente relevante no contexto atual, em que muitos clubes preferem apostar num jogador com nome e experiência, mas com margem de recuperação, do que arriscar num talento mais jovem e totalmente desconhecido. Não é um jogador fácil de categorizar. Não é um 10 puro, nem um 9 fixo, nem um extremo vertical. O seu jogo vive do espaço, da mobilidade, da liberdade criativa. Muitos treinadores exigem rigor tático e intensidade, algo que Félix raramente mostra. Além disso, tem-se tornado evidente que não se adapta às funções que lhe pedem. É colocado em posições onde não rende — e em vez de reagir, desliga. Tudo isto, aliado a baixos índices físicos, pouca entrega sem bola e um certo grau de conformismo, mina a confiança dos treinadores, mesmo quando o talento é evidente. Inclusive na Seleção Nacional Félix não conseguiu ainda atingir algum tipo de consistência.

O nome João Félix continua a ser uma marca forte. Foi uma das maiores transferências da história, passou por clubes de topo, jogou Liga dos Campeões, Mundiais, Campeonatos da Europa, ou seja, está presente em todas as grandes competições desde os 19 anos. Isto cria uma aura que, para muitos, ainda justifica o seu estatuto. Mesmo quando o rendimento não acompanha, o nome ainda abre portas. Em clubes que valorizam imagem, notoriedade, impacto mediático e, no caso do Benfica, nostalgia, Félix continua a ser útil. Um jogador com presença nas redes sociais, nos media e nos patrocinadores disfarça muitas vezes os fracos índices de performance em campo.
É impossível falar de João Félix sem falar de Jorge Mendes. O seu empresário tem um papel central na forma como a carreira tem sido gerida e protegida. O empresário garante que Félix, como muitos dos seus outros clientes, esteja sempre no radar dos tubarões, com contratos bem posicionados, empréstimos estratégicos e uma narrativa sempre pronta a ser vendida: “Precisa do ambiente certo.” A relação de Jorge Mendes com clubes de topo faz com que o nome do jogador nunca saia do circuito.
Félix nunca foi um fracasso total. Também nunca confirmou o rótulo de estrela. Vive nesse espaço ambíguo onde ainda é legítimo acreditar que pode explodir. É o tipo de jogador que alimenta a ideia da profecia do “escolhido”, e o ser humano adora uma boa história de redenção, especialmente se estivermos a falar de antigos Meninos de Ouro. Se eventualmente corre bem, o clube que tiver apostado nele naquele momento ganha crédito. Quando volta a falhar, é apresentado como uma tentativa justificável. Enquanto essa história estiver inacabada, o mercado continuará a olhar para Félix com alguma esperança. Continua a ter mercado porque representa algo que muitos clubes procuram: talento com margem de recuperação, estatuto internacional, capacidade técnica rara e uma história de adolescente promissor que ainda não chegou ao fim. Mas a margem está a encurtar. Se a próxima época não marcar um ponto de viragem, até o mercado poderá começar, por fim, a tratar o jogador não como uma promessa por cumprir, mas como um projeto que ficou pelo caminho. Em vez de ser Félix a desistir da bola e do jogo, poderá ser o futebol a desistir dele.




João Félix representa, de forma paradigmática, o fenómeno do “produto mediático” no futebol contemporâneo, em que o valor de mercado, a notoriedade e a narrativa se sobrepõem frequentemente à exigência desportiva e à consistência de rendimento. A sua trajetória ilustra como a construção de marca pode sustentar uma carreira no topo, mesmo quando os padrões de desempenho ficam aquém do esperado para um profissional de elite. Desde logo, o estatuto criado por umas das mais avultadas transferências da história do futebol. A venda do Benfica para o Atlético de Madrid por 126 milhões de euros foi um dos maiores negócios do futebol português e europeu e garantiu uma "linha de crédito" para Félix ser o centro das atenções globais ainda antes…
"há um facto inegável: João Félix tem qualidade." Altamente negável